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quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

A Grécia É Uma Fachada para Esconder o Maior Resgate Bancário de Sempre

Os ministros da zona euro que se encontraram em Bruxelas na noite passada para decidir o futuro da Grécia deviam ter assistido à oportuna conferência da Universidade de Londres sobre aprender lições com a América Latina.


A lição principal é de uma importância premente: as políticas económicas impingidas à América Latina no início dos anos 1980 foram uma excelente forma de ajudar os bancos dos EUA a recuperar da crise, mas uma maneira terrível de resolver a crise da dívida da América Latina, criando em vez disso duas décadas de mais dívida, pobreza e desigualdade.
Sem qualquer dúvida, foi precisamente este o objetivo dessas políticas — mudar o fardo da crise financeira do sistema financeiro para as nações em desenvolvimento.
O Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial emprestaram dinheiro a dezenas de países que de outra forma teriam entrado em incumprimento, por forma a manter os reembolsos da dívida a fluir de volta para os bancos do mundo rico que tinham dado origem à crise através das suas estratégias temerárias.
De seguida, esses países, que não beneficiaram de todo destes fundos “de resgate”, foram compelidos a implementar políticas de ajustamento estrutural que levaram à privatização da indústria, à libertação de dinheiro do controlo governamental e à abertura dos mercados à competição selvagem com empresas norte-americanas e europeias convenientemente subsidiadas. A pobreza multiplicou-se, a desigualdade proliferou e a finança foi proclamada rainha.
A mesma lógica jaz mal disfarçada por detrás do “resgate” à Grécia que os ministros das finanças europeus estão hoje a concertar. Não há sequer uma tentativa de fingir que o povo grego vai beneficiar com estes fundos.
É reconhecido que as medidas adicionais de austeridade que a Grécia tem que implementar para receber estes fundos, a que os sindicatos gregos apelidam de “atrozes”, vão causar estagnação e desemprego prejudiciais ao reembolso da dívida. Em 2020 a dívida da Grécia vai ainda representar uns insustentáveis 120% do PIB do país — e isso é se as coisas correrem mesmo muito bem.
O golpe adicional nas pensões de mais 13% e do salário mínimo em 22% e a grande redução da despesa com a concomitante perda de empregos no setor público, apenas pode ter como resultado uma depressão mais longa e profunda. Até as agências de rating já reconheceram a futilidade de forçar os países a uma estagnação contínua.
Portanto, qual é o objetivo do “resgate”? Manter dinheiro a entrar no sistema financeiro europeu. De facto, a provável criação de uma conta escrow ou de caução significará que o povo grego vai ser completamente contornado — o dinheiro vai ser emprestado por instituições europeias, sendo no fundo dinheiro dos contribuintes — e entrar nos cofres dos bancos europeus. É um resgate bancário numa escala gigantesca.
Mas as boas notícias para os bancos não acabam aqui. Ao forçar a Grécia a acelerar o seu programa de privatização de €50 mil milhões, toda a espécie de bens apetecíveis — desde aeroportos, portos e autoestradas até à água e ao saneamento — vão ser postos à venda para ser arrebatados pelos financeiros dos países que estão a impor estas políticas.
Os “resgates financeiros”, os duros cortes na despesa pública, o ataque à propriedade pública — todos refletem a experiência dos países em desenvolvimento entre 1980 e os anos 1990. O resultado foram duas décadas de desenvolvimento perdidas.
Até agora era invulgar países regredirem no que toca aos seus níveis de rendimento. Mas durante os anos noventa 54 países regrediram no que toca ao rendimento per capita e o número da pobreza extrema aumentou em 100 milhões — não por causa de guerra ou desastres naturais mas devido à dívida e ao ajustamento estrutural.
O bem-estar humano foi sacrificado em nome dos ditames do sistema financeiro.O aumento das taxas de homicídio, suicídio e de VIH na Grécia pintam hoje um cenário semelhante.
Há alternativas com as quais a Europa podia aprender.
Depois da Segunda Guerra Mundial foi concedido à Alemanha o perdão de uma enorme parte da dívida e o reembolso da dívida restante foi explicitamente ligado ao crescimento do país.
Mas o povo grego tem de esperar pela benevolência europeia. Embora não haja soluções indolores para a crise da dívida, quando os governos fizeram frente ao poder dos seus credores entrando em incumprimento, fazendo auditorias à dívida ou insistindo nas suas próprias condições de pagamento — desde a Argentina ao Equador e à Islândia — os resultados foram notoriamente melhores.
Além disso, eles fizeram algumas tentativas de recuperar a sua soberania dos caprichos de um sistema financeiro instável.
Essas soluções parecem estar para além da visão ou da coragem dos governos europeus, mas são soluções cada vez mais procuradas pelos povos da Europa.
Não admira que o ministro das finanças alemão tenha avançado com a ideia que um “comissário” seja nomeado para fiscalizar o protetorado europeu da Grécia ou, se isso não funcionar, que a democracia seja suspendida por tempo indeterminado. Este é o resultado lógico de considerar as pessoas antes de mais como um obstáculo ao reembolso dos seus bancos.
Nós propomos uma lógica diferente: quando a dívida não puder ser paga precisamos de parar de punir as pessoas menos responsáveis e começar a pensar em mudar as regras que governam aqueles que são responsáveis.


Tradução de Rita Peixeiro

Revisão de Helena Romão

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Brilhante carta aberta ao Sr. Silva


Que nunca doa a mente, nem as mãos, a quem escreveu esta carta aberta.



Exmo Senhor Presidente da República

Lisboa

Vou usar um meio hoje praticamente em desuso mas que, quanto a mim, é a forma mais correcta de o questionar, porque a avaliar pelas conversas que vou ouvindo por aqui e por ali, muitos portugueses gostariam de ver esclarecidas as dúvidas que vou colocar a V/Exa e é por tal razão que uso a forma "carta aberta", carta que espero algum dos jornais a que a vou enviar com pedido de publicação dê à estampa, desejando que a resposta de V/Exa fosse também pública.


Tenho 74 nos, sou reformado, daqueles que descontou durante 41 anos, embora tenha trabalhado durante 48, para poder ter uma reforma e que, porque as pernas já me não permitem longas caminhadas e o dinheiro para os transportes e os espectáculos a que gostaria de assistir não abunda, passo uma parte do meu dia a ler, sei quantos cantos há nos Lusíadas, conheço Camilo, Eça, Ferreira de Castro, Aquilino, Florbela, Natália, Sofia e mais uns quantos de que penso V/Exa já terá ouvido falar e a "navegar na net".
São precisamente as "modernices" com que tenho bastante dificuldade em lidar que motivam esta minha tomada de posição porquanto é aí que circulam a respeito de V/Exa afirmações que desprestigiam a figura máxima do País Portugal, que, em minha opinião, não pode estar sujeita a tais insinuações que espero V/Exa desminta categoricamente.
Passemos à frente das insinuações de que V/Exa foi 1º Ministro de Portugal durante mais de dez anos, época em que V/Exa vendeu as nossa pescas, a nossa agricultura, a nossa indústria a troco dos milhões da CEE, milhões que, ao contrário do que seria desejável, não serviram para qualquer modernização ou reforma do nosso País mas sim para encher os bolsos de alguns, curiosamente seus correligionários, senão mesmo, seus amigos. Acredito que esse tempo que vivemos sob o comando de V/Exa e que tanto mal nos fez foi apenas fruto de incompetência o que, sendo lamentável, não é crime, os crimes foram praticados por aqueles que se encheram à custa do regabofe, perdoe-me o popularismo, que se viveu nessa época e que, curiosamente, ou talvez não, continuam sem prestar contas à justiça.
Entremos então no que mais me choca, porque nesses outros comentários, a maioria dos quais anónimos mas alguns assinados, é a honestidade de V/Exa que é posta em causa e eu não quero que o Presidente da República do meu país seja o indivíduo que alguns propalam pois que entendo que o cargo só pode ser ocupado por alguém em quem os portugueses se revejam como símbolo de coerência e honestidade, é assim que penso que nesta carta presto um favor a V/Exa, pois que respondendo às questões que vou colocar, findarão de vez as maledicências que, quero acreditar, são os escritos que por aí circulam.


1ª Questão:

Circula por aí um "escrito" que afirma que V/Exa, professor da Universidade Nova de Lisboa, após ser ministro das finanças, foi convidado para professor da Universidade Católica, cargo que aceitou sem se ter desvinculado da Nova o que motivou que lhe fosse movido um processo disciplinar por faltar injustificadamente às aulas da Nova, processo esse conducente ao despedimento com justa causa, que se teria perdido no gabinete do então ministro da educação, a quem competiria o despacho final, João de Deus Pinheiro, seu amigo e beneficiado depois de V/Exa ascender a 1º Ministro com o lugar de comissário europeu, lugar que desempenhou tão eficazmente que o levou a ficar conhecido como "comissário do golfe".


Pergunta directa:

Foi ou não movido a V/Exa um processo disciplinar enquanto professor da Universidade Nova de Lisboa ?

Se a resposta for afirmativa, qual o resultado desse processo ?
Se a resposta for negativa é evidente que todas as informações que andam por aí a circular carecem de fundamento.


2ª Questão:

Circulam por aí vários escritos sobre a regularidade da transacção de acções do BPN que V/Exa adquiriu. Sendo certo que as referidas acções não estavam cotadas em bolsa e portanto só poderiam ser transaccionadas por contactos directos, vulgo boca a boca, faço sobre a matéria várias perguntas:

1ª - Quem aconselhou a V/Exa tal investimento ?
2ª- A quem adquiriu V/Exa as referidas acções ?
3ª- Em que data, de que forma e a quem vendeu V/Exa as acções ?
4ª- Sendo V/Exa um renomado economista, não estranhou um lucro de 140% numa aplicação de tão curto prazo ?


3ª Questão

Tendo em atenção o que por aí circula sobre a Casa da Coelha, limito-me a fazer perguntas:

1ª- É ou não, verdade, que o negócio entre a casa de Albufeira e a casa da Coelha foi feito como permuta de imóveis do mesmo valor para evitar pagamento de impostos ?
2ª- Se já foi saldada ao estado a diferença de impostos com que atraso em relação à escritura se processou a referida regularização ?

3ª- É ou não verdade que as alterações nas obras feitas na casa da Coelha, nomeadamente a alteração das áreas de construção foram feitas sem conhecimento da autarquia ?
4ª- A ser positiva a resposta à pergunta anterior, se já foi sanado o problema resultante de obras feitas à revelia da autarquia, em que data foi feita tal regularização e se foi feita antes ou depois das obras estarem concluídas ?

5ª- Última pergunta, esta de mera curiosidade, será que V/Exa já se lembra do cartório em que foi feita a escritura ?


4ª- Questão

Esta não circula na Net, é uma questão que eu próprio lhe coloco:

Ouvi V/Exa na TV dizer que tinha uma reforma de 1300 €, que quase lhe não chegava para as despesas, passando fugazmente pela reforma do Banco de Portugal. Assim, pergunto:

1ª- Quantas reformas tem V/Exa ?

2ª- De que entidades e a que anos de serviços são devidas essas reformas ?

3ª- Em quantas não recebe 13º e 14º mês ?
4ª- Abdicou V/Exa do ordenado de PR por iniciativa própria ou por imposição legal ?
5ª Recebe ou não V/Exa alguns milhares de euros como "despesas de representação" ?
Fico a aguardar a resposta de V/Exa com o desejo de que a mesma seja de tal forma conclusiva e que, se V/Exa o achar conveniente, venha acompanhada de cópias de documentos, que provem a todos os portugueses que o que por aí circula na Net, não passam de calúnias e intrigas movidas contra a impoluta figura de Sua Exa o Senhor Presidente da República de Portugal.



A terminar e depois de recordar mais uma das suas afirmações na TV, lembro uma frase do meu avô, há muito falecido, alentejano, analfabeto e vertical:
" NÃO HÁ HOMENS MUITO, OU POUCO SÉRIOS, HÁ HOMENS SÉRIOS E OUTRAS COISAS QUE PARECEM HOMENS".

Por mim, com a idade que tenho, já não preciso nem quero nascer outra vez, basta-me morrer como tenho vivido. Sério.


Com os meus melhores cumprimentos.

José Nogueira Pardal



O remetente declara-se Objector do Acordo Ortográfico

SE REENCAMINHAR ESTA MENSAGEM:

1º - Apague o meu e-mail e o meu nome.

2º - Envie como cópia oculta ( Bcc ) para os SEUS destinatários.



sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Património em risco...



Editorial do Jornal de Angola

08 de Fevereiro, 2012

Os ministros da CPLP estiveram reunidos em Lisboa, na nova sede da organização, e em cima da mesa esteve de novo a questão do Acordo Ortográfico que Angola e Moçambique ainda não ratificaram. Peritos dos Estados membros vão continuar a discussão do tema na próxima reunião de Luanda. A Língua Portuguesa é património de todos os povos que a falam e neste ponto estamos todos de acordo. É pertença de angolanos, portugueses, macaenses, goeses ou brasileiros. E nenhum país tem mais direitos ou prerrogativas só porque possui mais falantes ou uma indústria editorial mais pujante.
Uma velha tipografia manual em Goa pode ser tão preciosa para a Língua Portuguesa como a mais importante empresa editorial do Brasil, de Portugal ou de Angola. O importante é que todos respeitem as diferenças e que ninguém ouse impor regras só porque o difícil comércio das palavras assim o exige. Há coisas na vida que não podem ser submetidas aos negócios, por mais respeitáveis que sejam, ou às "leis do mercado". Os afectos não são transaccionáveis. E a língua que veicula esses afectos, muito menos. Provavelmente foi por ter esta consciência que Fernando Pessoa confessou que a sua pátria era a Língua Portuguesa.
Pedro Paixão Franco, José de Fontes Pereira, Silvério Ferreira e outros intelectuais angolenses da última metade do Século XIX também juraram amor eterno à Língua Portuguesa e trataram-na em conformidade com esse sentimento nos seus textos. Os intelectuais que se seguiram, sobretudo os que lançaram o grito "Vamos Descobrir Angola", deram-lhe uma roupagem belíssima, um ritmo singular, uma dimensão única. Eles promoveram a cultura angolana como ninguém. E o veículo utilizado foi o português. Queremos continuar esse percurso e desejamos que os outros falantes da Língua Portuguesa respeitem as nossas especificidades. Escrevemos à nossa maneira, falamos com o nosso sotaque, desintegramos as regras à medida das nossas vivências, introduzimos no discurso as palavras que bebemos no leite das nossas Línguas Nacionais. Sabemos que somos falantes de uma língua que tem o Latim como matriz. Mas mesmo na origem existiu a via erudita e a via popular. Do "português tabeliónico" aos nossos dias, milhões de seres humanos moldaram a língua em África, na Ásia, nas Américas.
Intelectuais de todas as épocas cuidaram dela com o mesmo desvelo que se tratam as preciosidades.
Queremos a Língua Portuguesa que brota da gramática e da sua matriz latina. Os jornalistas da Imprensa conhecem melhor do que ninguém esta realidade: quem fala, não pensa na gramática nem quer saber de regras ou de matrizes. Quem fala quer ser compreendido. Por isso, quando fazemos uma entrevista, por razões éticas mas também técnicas, somos obrigados a fazer a conversão, o câmbio, da linguagem coloquial para a linguagem jornalística escrita. É certo que muitos se esquecem deste aspecto, mas fazem mal. Numa entrevista até é preciso levar aos destinatários particularidades da linguagem gestual do entrevistado.
Ninguém mais do que os jornalistas gostava que a Língua Portuguesa não tivesse acentos ou consoantes mudas. O nosso trabalho ficava muito facilitado se pudéssemos construir a mensagem informativa com base no português falado ou pronunciado. Mas se alguma vez isso acontecer, estamos a destruir essa preciosidade que herdámos inteira e sem mácula. Nestas coisas não pode haver facilidades e muito menos negócios. E também não podemos demagogicamente descer ao nível dos que não dominam correctamente o português.
Neste aspecto, como em tudo na vida, os que sabem mais têm o dever sagrado de passar a sua sabedoria para os que sabem menos. Nunca descer ao seu nível. Porque é batota! Na verdade nunca estarão a esse nível e vão sempre aproveitar-se social e economicamente por saberem mais. O Prémio Nobel da Literatura, Dário Fo, tem um texto fabuloso sobre este tema e que representou com a sua trupe em fábricas, escolas, ruas e praças. O que ele defende é muito simples: o patrão é patrão porque sabe mais palavras do que o operário!
Os falantes da Língua Portuguesa que sabem menos, têm de ser ajudados a saber mais. E quando souberem o suficiente vão escrever correctamente em português. Falar é outra coisa. O português falado em Angola tem características específicas e varia de província para província. Tem uma beleza única e uma riqueza inestimável para os angolanos mas também para todos os falantes. Tal como o português que é falado no Alentejo, em Salvador da Baía ou em Inhambane tem características únicas. Todos devemos preservar essas diferenças e dá-las a conhecer no espaço da CPLP. A escrita é "contaminada" pela linguagem coloquial, mas as regras gramaticais, não. Se o étimo latino impõe uma grafia, não é aceitável que através de um qualquer acordo ela seja simplesmente ignorada. Nada o justifica. Se queremos que o português seja uma língua de trabalho na ONU, devemos, antes do mais, respeitar a sua matriz e não pô-la a reboque do difícil comércio das palavras.  

PS: Oxalá o acordo não vá avante, mais porque foi feito por um governo corrupto e sem um mínimo de escrúpulos…